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  • Foto do escritorAldomar de Castro

Tradição

Ensinam as enciclopédias e os dicionaristas que “tradição”, é o ato de transmitir ou entregar; transmissão oral de lendas, fatos, acontecimentos e coisas boas, de idade em idade; transmissão de valores espirituais, conhecimento ou prática de hábitos inveterados; recordações, memórias, etc. “para o gaúcho a tradição é um culto quase como uma religião. Para nós gaúchos, tradição é tudo de bom que venha do passado e que não conflite com o progresso, deve ser preservado, vivido e cultuado. O grande sociólogo e folclorista Câmara Cascudo, escreve: “A memória é a imaginação do povo, mantida e comunicável pela Tradição, movimentando as culturas convergidas para uso, através do tempo. Essas culturas constituem quase a civilização nos grupos humanos. Mas existe um parâmetro de observações que se tornam normas. Normas fixadas no costume, interpretando a vontade popular. ”São estas normas fixadas no costume, como muito bem definiu o professor Cascudo, que o gaúcho tradicionalista, consciente, preserva, não só para sua satisfação pessoal, mas que seja sentida e vivida por seus semelhantes. O tradicionalismo é aquele estado de espírito que cada cultor sente ao projetar feitos e hábitos de antanho para as fainas atuais sem ferir princípios básicos de ordem procedimental. Outro sociólogo, aqui dos nosso pagos; Armando Câmara, afirma: “Tradição não é, pois, um simples tema sentimental, arcaísmo estranho, saudade apostas as exigências da perfeição social. Tradição não é fidelidade aos desvalores e as taras de um passado que, dadas as contingências humanas, possuiu, como possui o presente e possuirá o futuro, males, erros, imperfeições e injustiças sociais. O que se deve amar e servir na tradição é o seu conteúdo de valores positivos, comprovado por experiências seculares. É a esses valores que devemos dar fidelidade não por serem passados, mas por serem eternos. O presente e o futuro valerão na medida em que os encarnarmos no interior de novas circunstâncias históricas, traduzindo-os em ordenamentos sociais mais justos”. A compreensão coletiva de toda esta gama de considerações cristalizou-se na alma gaúcha, sublimando a tradição em tradicionalismo, que para o gaúcho é uma filosofia de vida, um modo de ser, de sentir, de pensar e de agir. Filosofia que se transformou num manancial de solidariedade humana. “um nacionalismo pronto a despertar e agir no momento em que os interesses nacionais venham a exigir o seu pronunciamento”; no abalizado dizer de Olinto Sanmartin e já tantas vezes posto em prova e comprovado. Podemos considerar como marco inicial do tradicionalismo organizado no Rio Grande do Sul, o dia 24 de abril de 1948 com a fundação do “35” Centro de Tradições Gaúchas. O “35”foi a sementeira desta seara de agremiações congêneres que hoje atinge o Sul e Centro-Oeste e com ramificações no Norte do País, que se faz representar praticamente em todo o Brasil. Tomando a feição de uma estância simbólica onde o presidente é o patrão, os departamentos, são as invernadas , os integrantes femininos são as prendas e os masculinos denominam-se peões. Organizaram-se como Centros de Tradições Gaúchas, verdadeiros centros culturais, associando, principalmente a poesia, a música, as danças em suas expressões locais e, atualmente, com a grande atualização das ” Festas Campeiras, através das Leis nº.11.719 e 11.720 de 07 de Janeiro de 2002), entrou nesse rol de atividades as lides campeiras, artísticas ou desportivas, entre elas as habilidades com o cavalo. Na verdade esses Centros vêm escrevendo um capítulo especial do nosso urbanismo que precisa ser melhor estudado. Estão numa fase de diálogo entre a vivência urbana e o campo, sendo que os primeiros passaram a adotar ou, a seu modo entendem terem adotado os hábitos rurígenas. Este estágio já envolve grande parte da sociedade convencional. O Galpão, não só conquistou o seu espaço social junto ao povoeiro como carismaticamente, por filosofia ou por princípio envolve seus novéis participantes. Com muita razão Vianna Moog, dizia em conferência na Academia Rio-Grandense de Letras: – Enquanto o Kerb morre na colônia, sem ter atingido o campo, o fandango de lá vem e invade vitoriosamente a colônia e a cidade”. É claro que a simplicidade, o respeito e a espontaneidade imperam na representatividade da cultura popular. Nem tudo tem sentido autêntico ou verossímel. Mas é inegável que seus praticantes tenham procurado evitar que se propague um procedimento errôneo de imobilismo ou de regressão e cultivando a mensagem de que não se trata de mero fato repetitivo do passado, que não é um modelo, mas cultuá-lo porque é exemplo. Não um lago parado, como dizia Glaucus Saraiva da Fonseca, mas um rio que anda. Dentro dos Centros de Tradições Gaúchas, nasceram os festivais, a exemplo da Califórnia da Canção que num ritmo extraordinário pulverizou o Rio Grande do Sul de califórnias, penhas, tertúlias e tudo mais que possa reunir composições musicais ou temas da querência. Este fenômeno também pode e deve ser observado com mais critério, pois a ânsia, a vontade, o desejo ou o bairrismo de divulgar sua querência em claves, no menor tempo possível, adotou o infiel procedimento da imperfeição. Arremessou para longe de realidade, determinando ritmos que nem se quer aculturaram-se e tantos outros que nem revelam os anseios da nossa gente. Estes festivais contribuíram, contribuem e certamente contribuirão com o tradicionalismo, resguardando é claro as propostas aceitáveis do invencionismo e do modismo, ingredientes malignos aos cultores da tradição. No rol dos tradicionalistas, a grande maioria recebe informações através de fontes dignas e credenciadas que oferecem com perfeição todas as normas do culto as tradições. Em contra partida, uma insignificante minoria procede de maneira errônea, desaconselhavel e irreal; por incrível que pareça, esta minoria errada, desconcertante é a que mais marca e reúne mais adeptos para a prática de tais impropérios. Assim como o fandango invadiu a colônia e a cidade os disparates, as tontas pleiteiam promiscuidade na cultura tradicional. Enquanto o tradicionalista firma seu procedimento nas bases culturais do Rio Grande do Sul, construídas por mãos de vaqueanos detentores das boas informações da querência, esculpidas na rocha do tempo, os aventureiros e desenformados cancheiam as mágoas de irrealidade com incomensuráveis possibilidades de chagar a lugar nenhum.

CRESCENTE DE JANEIRO DE 2002

CALTARS – “TO”

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